Desde a concepção iluminista de tolerância, a desconfiança em relação às certezas irretorquíveis e o acolhimento do outro passaram a orientar relações sociais e políticas pluralistas e democráticas, tendo em vista a proteção da pessoa e a promoção da justiça e da paz. Contudo, há uma permanente tensão entre reivindicações de direitos e conquistas garantidas, que se enraíza em questões sociais e culturais associadas à noção do tolerável ou do que pode ser admitido como equiparável, simétrico e, portanto respeitável, apesar de diferente. No âmbito deste artigo, partindo de uma concepção de tolerância religiosa como origem do pluralismo democrático, quer-se investigar, a tênue fronteira que separa o aceitável do não-aceitável, o cidadão daquele que, apesar de se assim chamado, não pode exercer sua cidadania, sua voz não é ouvida, não participa. A discussão acerca da fragilidade do pluralismo democrático será feita a partir da análise do pensamento de Alexis de Tocqueville. A análise de seu pensamento é bastante importante porque, tendo caracterizado a democracia pela confluência entre condições sociais de igualdade e condições políticas de liberdade, quando visitou os Estados Unidos em 1830 explicita, com certa ironia, existência de democracia exclusivamente entre os “anglo-americanos”. Narrando a situação social e política vivida pelos negros e indígenas que habitavam a América do Norte, repudia e denuncia a exclusão e a violência às quais estavam submetidos. Embora Tocqueville afirme que a exclusão de negros e indígenas da democracia norte-americana seja uma ameaça à própria democracia, sua concepção parece admitir a integração pela assimilação da cultura democrático-européia por parte dos negros e indígenas. A tensão entre “anglo-americanos”, negros e indígenas existente, será objeto de análise a fim de discutir a possibilidade de inclusão do outro e os limites do pluralismo democrático confrontando ideias presentes em A Democracia na América e Cartas Mexicanas, escritas por Tocqueville na mesma época de sua viagem aos Estados Unidos, e outros escritos referentes à discursos políticos proferidos na Assembleia Francesa.
Assuming the notions of tolerance as acceptance and respect for the differences and of democracy as a political and social space characterized by the equality of social conditions and the exercise of freedom, our aim is to investigate if the pluralist democracy of Alexis de Tocqueville admits interculturality understood as an integrative and respectful behaviour towards the perspectives of non-hegemonic cultural groups. Although Tocqueville had stated that the exclusion of afro descendants and native groups from democracy in the United States was a threat to democracy itself, his conception does not seem to admit the integration of these communities but only their assimilation and subordination to a western democratic perspective. Thus, the pluralism that is considered central to democracy seems to fit only those people belonging to a western european and anglo-american tradition. Our purpose, therefore, is to investigate the relations between distinct cultures sharing one same political democratic space, confronting the ideas presented in Democracy in America and The Mexican Letters, both written by Tocqueville at the time of his trip to the United States. The approach to the subject assumes a decolonial perspective, respectful and welcoming to cultural diversity, aiming at the creation of a social and political democratic space radically pluralist that is also a safeguard for the Principle of Tolerance amongst the people